Ontem na Sic passou uma reportagem/documentário, "Histórias com Gente dentro". Às tantas mostrava a história de uma pastora de Bragança, com 29 anos. Nunca tinha ido a Lisboa e nunca tinha visto o mar. A equipa da sic levou-a à capital e acompanhou-a registando as palavras e emoções.
Eu tenho 27 anos e também sou de Bragança. Já vi o mar várias vezes. Estudei no Porto e já estive várias vezes em Lisboa. Não, minto. Na verdade estive nos arredores de Lisboa. A primeira vez que conheci verdadeiramente a capital, os seus monumentos, o Bairro Alto, isso foi só mesmo este ano, ainda tinha 26 anos.
Dizia a menina pastora, já no fim da reportagem, que gostava de ir para Lisboa. Ee quem sabe, a vida dá tantas voltas... O olhar dela, no entanto, mentia. Provavelmente ela não vai vender o rebanho e não vai arriscar uma ida para Lisboa. Faltou-lhe, faltaram-nos, as mesmas oportunidades que os meninos que vivem no litoral sempre tiveram.
E lembrei-me de mim. Quando fui para o Porto nunca tinha visitado um verdadeiro museu de arte, porque aqui não havia. Já tinha lido imenso, sim, mas nunca tinha entrado num teatro ou assistido a uma verdadeira peça teatral. Só na aldeia dos meus avós e isso já foi há muito tempo. Num tempo em que ainda havia escolas e crianças.
Foi uma adaptação difícil e mais difícil foi voltar. Mas Portugal é assim mesmo. Não dá as mesmas oportunidades a todos os seus cidadãos. Aqui tudo exige o dobro do esforço, do empenhamento, da garra. Aqui tudo fica longe, tudo é inacessível, tudo é difícil. Mas sonhar ainda é permitido e é verdade que a vida pode dar muitas voltas menina pastora.