Quando entrei e sorridente cumprimentei os colegas, ninguém imaginava que me preparava para fazer a minha declaração mais bombástica de sempre. Para mim, pelo menos.
Tinha passado a noite toda a pensar em tudo o que tinha para dizer e que há anos se entalava na garganta. No trajecto de casa ao trabalho, pensei mais uma vez. Digo apenas o que tenho a dizer e venho embora ou digo tudo o que sempre quis dizer e venho embora?
Estive sempre inclinada para a segunda opção. A meio da tarde pedi aos dois senhores que me acompanhassem para a mítica salinha de reuniões. Sem saberem o que esperar de mim, nunca antes tinha feito tal coisa, seguiram-me calados, entreolhando-se.
- Bom, pedi para reunirem comigo porque lhes quero dizer que me vou embora
Bummmmmmmmmmm. Senti o meu coração acelerar. Não era nada disso que estava pensado.
Eles entreolharam-se e, depois de um silêncio que pareceu durar horas, ele finalmente disse.
- Muito bem. E vais para onde?
- Vou-me embora. O P. foi colocado em Évora, aqui nunca teve oportunidade de trabalhar na área. Eu vou com ele.
- E tens alguma perspectiva? Vais fazer o quê? Tens a certeza?
- Aqui não tenho nenhumas perspectivas também. A vantagem de ir é que finalmente me liberto de vocês e de tudo isto. Aliás, pensei que era isso mesmo que vocês queriam!
Trim, trim, trim.
Acordo sobressaltada com o despertador. Tenho o cabelo molhado de suor e sinto-me gelada. Afinal, tudo não tinha passado apenas e só de um sonho. Ainda não foi desta que me consegui libertar...